segunda-feira, 25 de abril de 2011

Dos limites do conhecimento - Osvaldo




Há certa tendência à irrefutabilidade e “perniciosidade”no que tange o conhecimento “absoluto” quando este está associado à lógica em seu último grau, como que uma cartada final para todos os problemas do pensamento humano,mas o problema apenas se inicia aí, quando o mesmo sai da esfera das “concatenações” de idéias claras.
Desde os primórdios da filosofia, por assim dizer, existiram preocupações sobre a possibilidade de existir algo, e ainda, caso as coisas fossem conhecidas, ficaria claro que elas seriam conhecidas. É famosa, por exemplo, a insistência de Sócrates de que ele não sabia nada. E Protágoras, o mais famoso dos sofistas , teve sua reputação amplamente baseada na declaração de que o “homem é a medida de todas as coisas”, com o que ele queria dizer, grosso modo, que todas as crenças são verdadeiras a partir da perspectiva da pessoa que afirma a crença...fato este que vem a ser corroborado na fenomenologia e também na primazia do sujeito epistemológico, que não está mais, de certa forma, sujeito a um encadeamento de rígidas regras que não três ou quatro, simples para a averiguação da “verdade”.
A visão de Protágoras é um dos primeiros exemplos de relativismo; isto é, refere-se à idéia de que as coisas somente são verdadeiras ou falsas a partir de determinadas perfectivas .
As respostas que essa declaração têm provocado, desde então, são indicativas do modo como os filósofos, por séculos, tentaram lidar com aquilo que vêem como ameaça do relativismo.
Em primeiro lugar, seus críticos tentaram mostrar que a afirmação se auto-refutava. Se todas as crenças são verdadeiras desde a perspectiva de alguém, então a crença de que todas as crenças não são verdadeiras desde a perspectiva de alguém também deve ser verdadeira. Um paradoxo. Infelizmente, esse argumento era refutado por si só de modo fácil. O relativista não universaliza afirmações verdadeiras; em outras palavras, a afirmação dele diz apenas que as crenças são verdadeiras para as pessoas que as adotam, e não que elas são verdadeiras para todo mundo.
Mas aí temos outro problema, pois isso oferece ao relativista uma objeção muito mais forte. Se a afirmação diz que as crenças são verdadeiras para todos, apenas no sentido limitado de que qualquer crença particular é verdadeira para a pessoa que a afirma isso, então é uma afirmação vazia, e não faz sentido que tal idéia pode de fato ser verdadeira apenas para uma pessoa, agredindo assim a idéia de verdade “universal”.
A lógica no entanto é um exercício para que possamos “sair” deste relativismo extremo, mas não obstante, incorremos no risco de nela também limitarmos nossas ultimas reflexões., daquelas que não comportam sua linguagem e formatação.
Embora neste primeiro momento estando averiguando o papel da lógica no conhecimento, é “práxis” salientar mesmo em primeiro plano (“introdutório”) , que isto não finda apenas na elaboração do discurso claro ou de sua “tangibilidade” em relação ao que é possível conhecer. Portanto, em se tratando de filosofia e de nossos clássicos filósofos, ao menos aqueles que impactaram a teoria do conhecimento em si, é notório que isto só é possível, a priori, através de um argumento lógico, mesmo que de certa lógica resulte ditas “circularidades” ou refutabilidades, como o famoso Argumento Ontológico de Descartes.

Em se tratando ainda de conhecimento, é sábio afirmar que o relativismo e o ceticismo ainda não desapareceram e formam um dos pilares marcantes da filosofia.
Assim, os pensadores do primeiro período moderno, tais como Montaigne, se preocuparam com eles, depois que souberam que pessoas viviam vidas muito diferentes no novo Mundo. Os filósofos dos séculos XVIII e XIX se preocuparam com as implicações do ceticismo do projeto de Descartes , de encontrar os fundamentos indubitáveis do conhecimento , e também com a idéia de Locke, de que o conhecimento está enraizado em impressões dos sentidos vindas do mundo exterior.
Posteriormente, os filósofos do século XX se interessaram pelo papel que a linguagem desempenha em nossa compreensão do mundo, se, de fato, as afirmações verdadeiras são discursos ou “jogos de linguagem” particulares, e , mais radicalmente, se a linguagem não se refere a nada no mundo em absoluto.
A epistemologia, então, como o ramo da filosofia que se interessa pelo conhecimento, é frequentemente um exercício de “apagar incêndios” , preocupada nem tanto com o que sabemos como com a refutação da afirmação de que nada sabemos em absoluto.

sábado, 26 de março de 2011

Nossas bases educacionais não atendem nenhum objetivo - Osvaldo


Bem, um objetivo seria alcançado se a mesma fosse coerente e real segundo nosso contexto social. É também evidente que devemos separar aqui algumas escolas que se projetam, saindo este lamaçal, como expoentes que são impreterivelmente alçados segundo o esforço de uma comunidade, onde o Estado, por sua vez, pouco interfere ou quando muito atrapalha mais com a verborragia dos ditos doutos pedagógicos que seguem os interesses partidários e os seus mesmos.
Diante de tal perspectiva, a de um Estado democrático, seu exercício é lamentável no que diz respeito ao suprimento desta necessidade básica, e por assim dizer, não vejo hoje uma escola melhor do que a do meu tempo de estudo, onde o professor tinha um papel não somente de instrutor, mas também de formador de opiniões, e isto em um Estado muito precário, recém saído de uma ditadura em que o ensino também havia sido sucateado. Pra se pensar...
Hoje o que vemos no ensino são várias confluências de forças díspares que se repelem, onde entram o papel do professor, do Estado, dos pedagogos que também pouco ajudam, da falta de identidade do novo professor e sua precária formação, e tudo isso como em uma torre de babel em que uma predominante e eficaz comunicação é inexistente, quase que alçando nossa educação a um nível de utopia no que tange suas soluções, dado esta problemática que se tornou endêmica.
Propostas temos aos montes, nem um versado e douto pedagogo necessitamos ser, no entanto o caminho para chegarmos até lá é árduo, e eu particularmente conheci alguns professores que deixaram cair a bandeira da ideologia rumo a uma solução dos problemas da educação.
Por certo um discurso poliano aqui é bem cabível aos esfuziantes que alardeiam o contrário daquilo que não sentiram” in loco” , e para seu maior agravo um balizador que outrora se chamava “avaliação” esvaneceu-se na hilariante viagem que tomou nossa educação ao longo daquilo que se chama um Estado democrático.
Creio que não é somente senso comum, no que tange os pais e responsáveis frente seus filhos na escola, como uma questão de lógica e prudência a necessidade de avaliações, mas aqui não poderemos considerar uma questão de lógica que abranja todas as instâncias sociais, pois a mesma é ininteligível para muitos pedagogos, ao menos aqueles que se debruçam sobre os mantos de autoridades governamentais em ritmo de petitórios próprios, e dos que pensam em educação “para inglês ver”.
Oras, se não há uma base sólida para se avaliar, não há portanto o que ser avaliado, estrutura esta que fomenta os interesses de projeções internacionais que visam apenas o capitalismo selvagem, esquecendo-se da pessoa humana.
Há vários quesitos que circundam um processo avaliativo, para citar um, é o da própria qualidade de ensino da instituição que tem em seu bojo nada mais nada menos que indivíduos em seu processo de formação, em todos os níveis, pois a escola hoje é somente reflexo do mesmo, e não uma instância “outra” que não daquele mesmo universo já conhecido pelo aluno.
As ótimas escolas privadas, nas mãos de quem detêm muito dinheiro para o custeio, ao analisar uma posição em uma prova não muito herculeamente elaborada, e ao averiguar sua posição no ranking nacional, irá para o próximo ano fomentar promoções no seu ensino de modo que possa obter melhor colocação.
Devo salientar aqui duas coisas, primeiro: São Paulo é vergonhosamente ficado para trás de escolas do norte e nordeste, e até do Rio de Janeiro, e aqui não á conotação pejorativa, apenas estranho o modo da mais rica federação conduzir seu ensino e forma de avaliação; segundo: Se verificarmos os procedimentos das escolas “exemplo”, todo instante há simulados e avaliações que situam o aluno verdadeiramente de acordo com sua absorção e rendimento escolar.
Não obstante, isto também denota uma proximidade maior entre aluno e professor/instituição, no que diz respeito à avaliação e seus desdobramentos posteriores.
Não é preciso dizer mais nada, pois aqui neste debate todos expuseram a realidade e as necessidades de nossa educação nacional .

sexta-feira, 11 de março de 2011

Quando o humanismo se transforma no “desumano” - Osvaldo


Penso que a erudição da filosofia e sua linearidade às vezes se perdem nos fatos e se situam apenas em maior grandeza nos solavancos entre épocas e em sua tensão dialética de períodos, quando um tenta ser melhor que o outro. No entanto, assim como o positivismo foi outrora algo “promissor”, esta mesma tensão dialética não aponta para o futuro sinais de melhorias no ser humano quando o mesmo preserva ainda instintos “medievais” e um inexorável desejo de sobrepujar as emoções através da razão.
Por assim dizer, notamos cada vez mais uma sociedade advinda de um movimento que por sua vez, novamente, era a bola da vez nesta “dialética”: o renascimento.
É obvio que aqui devemos usar aspas para muitas questões perpetradas durante o período medieval, de forma substancial àquelas relacionadas ao poder das instituições e do uso das questões “divinas” ao bel prazer de seus fins.
Oras, por mais extenso que seja este assunto, e por mais extenuante que seja suas nuanças, qual seria de fato a régua para a medição da melhoria do homem enquanto individuo? Talvez neste processo apenas pulamos de uma extremidade para a outra: o “Egocentrismo”, a individualização, a falta de noção de alteridade e a cada vez mais crescente perda de identidade mediante a virtualidade (lê-se virtualidade aqui, ipsis litteris, no sentido de uma consciência que não a minha, a verdadeira perda do sujeito cognoscente).
Penso que não há muita diferença entre um advento “medieval”, no que tange o homem olhar dentro de si mesmo, para nosso momento atual onde prevalece um niilismo provindo da saturação do conhecimento, o homem prestes a “explodir”.
Isto é um simulacro, uma realidade “virtual”, é o fato da ciência, como a praticamos hoje, seja possível prova de que os instintos elementares que protegem a vida deixaram de funcionar. Talvez qualquer verdade que ameaça a vida não é uma verdade. É um erro.
O império da razão instrumental e seus desdobramentos é um verniz social apenas, isto gera otimismo. Sua insistência na forma, na beleza visual e na compreensão racional ajuda a fortificar-nos contra o terror de nossas emoções , e contra o frenesi irracional que elas produzem.
Por fim, gostaria de citar Nietzsche , quando ele recorda a velha lenda na qual o rei Midas procura Sileno, o companheiro constante de Dionísio, e lhe pergunta: “qual a maior felicidade do homem?” O demônio permanece mal humorado e sem se comunicar, até que finalmente, forçado pelo rei, solta um riso agudo:

“Patife efêmero, nascido por acidente e trabalho árduo, por que me obrigas a dizer-te que seria tua maior benção não ouvir? o que seria melhor para você está fora de seu alcance: não ter nascido, não ser nada, mas a segunda melhor coisa é morrer cedo”.

Bem, de fato , se perceberem,isto é uma alusão à obliteração contemporânea do homem para consigo mesmo, e já que usei esta lenda recobrada por Nietzsche em sua filosofia, finalizo dizendo que a cultura helênica apenas suportou essas terríveis verdades com a ajuda de outro deus: Apolo, que nada mais é do que a razão sobrepujando as emoções.
Penso que há de fato apenas uma tênue linha que separa o homem atual de seu antepassado mais primitivo, e por certo a pretensa erudição que o pensamento ocidental proporciona, no que tange sua racionalidade, não é o cerne para as questões mais humanitárias enquanto homem e sua alteridade, e espelho existencial.

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Dos paradoxos da fé e da temporalidade mediante a existência. Dos lampejos do Absurdo e do sentimento de Angústia - Osvaldo



(A imagem acima faz alusão ao mito de Sísifo,que também é um ensaio filosófico de Albert Camus, no qual ele introduz a filosofia do absurdo: o homem fútil em busca de sentido, unidade e clareza no rosto de um mundo ininteligível desprovido de Deus e eternidade. A última parte deste ensaio remete o leitor a Sísifo, personagem da mitologia grega que fora condenado a repetir a mesma tarefa de empurrar uma pedra até o topo de uma montanha, só para vê-la rolar para baixo novamente, toda vez, enquanto viver...)


Não há exageros em dizer que toda humanidade vive em uma "casca de ovo" com toda sua limitação mental. E também é errado citar que ser existencial é sofrer de “enxaquecas” da insustentável leveza do ser. Papo para encher consultórios que exercem verborragias psicológicas e psiquiátricas. Mas para se ter uma visão “existencial” do mundo é preciso coragem, ousadia, rompimento,e talvez “saúde mental”, por mais redundante ou circular que isto possa soar.
De tempos já longínquos fé e razão parecem não se misturar, mesmo após tentativas da racionalização da fé através de dogmas perpetrados por Agostinho ou Aquino no cristianismo, ou mesmo do argumento ontológico de Descartes que culminaria na existência de Deus, sendo que sua impossibilidade não poderia ser “cogitada” . Não obstante, há certa questão a ser observada pelos doutos da igreja pela forma que estes tentaram unir a fé à razão, em Agostinho temos a premissa de “crer para entender”, e em Aquino o fato de “compreendermos para crer”
Controvérsias à parte, eu cito estes dois pensadores, ou teólogos da igreja católica, pelo fato de ambos tentarem “sistematizar e/ou racionalizar” aquilo que muitos ainda hoje apenas permanecem “tateando no escuro”, dado o fato que a própria metafísica , dentro do escopo epistemológico, seria como um cego a procura de um gato preto dentro de uma sala escura.
Mas também destas ditas “sistematizações” ou tentativas homéricas de trazer a vontade de Deus para um escopo totalmente existencial e paradoxal , como diria o pensamento kierkegaardiano, desembocamos novamente nos paradoxos existenciais que confrontam um almejo pela procura de Deus mediante o “absurdo” da temporalidade e da incognoscibilidade do mesmo, de nossa posição existencial, “ipsis litteris”, desconectada daquilo que seria a fé do homem.
Posto isto, é notório que o existencialismo é uma corrente de pensamento que rompe além de uma década de intelectuais franceses engajados em questões políticas e de guerras inconcebíveis em sua sociedade de então. É muito provável que se nós seres humanos, longe do hábito inexorável de tudo conectar como possíveis juízos analíticos de causa e efeito, e se os absurdos mais “gritantes” como de uma guerra eminente a eclodir, iríamos novamente, e sempre, buscar justificativas para tal ou então repensar a verdadeira condição humana enquanto "contingência".Da eterna fragilidade de um ser circundado de iminentes ameaças a si mesmo, e estas, para além das idiossincrasias perpetradas  pelo próprio homem; daquelas que ainda fogem da compreensão humana e que nos remetam a árdua e convicta noção de nossas impossibilidades de compreensão.
Uma vez que nossa capacidade de raciocínio é por demais limitado, nos defrontaríamos novamente com a necessidade de nos lançar a um “salto de fé” como consolo metafísico ao tentar entender quais os reais desígnios de Deus e a temporalidade e fragilidade de nos seres humanos, seja através de conceitos como “o Mal ontológico, ou de que o homem é eternamente causador de suas próprias idiossincrasias: Eis aí novamente algo circular, o homem e sua mente ao concatenar juízos apriorísticos e/ou a posteriori, dentro de sai própria limitação de causa e efeito (causalidade).
Artigos de fé não são somente aqueles relacionados às religiões, mas também daquilo que está cercado de inexorabilidade no que tange conceitos de causalidade e senso comum. Não obstante, a fé, seja ela qual for, é uma instância como de um “vôo cego” rumo à certeza “titubeante” de que nossa meta final é um encontro com o divino.
Dentro deste patamar, o homem passa por determinadas fases em sua vida, algumas nas quais experimenta apenas aquilo que proporciona um imediatismo prazeroso, ou mesmo uma autoconsciência de valores hedonistas ou niilistas, mas a imagem do divino esta sempre escondida no final do túnel se sua jornada.
Impreterivelmente, a questão de fé é um “salto” rumo ao desconhecido, àquilo que jamais poderá estar inserido, via racional, dentro deste véu que nos separa da amplitude e complexidade da existência. Forma-se desta forma o sentimento quase que “insuportável”, para os mais desavisados e também de certa forma para os calejados, quando da ruptura da casca de ovo, do paradoxo entre nossa finitude (desconhecimento plausível de Deus), e o desejo e vontade de a Deus conhecer e seguir. (Lê-se aqui Deus como qualquer teoria metafísica que assim o aborde).
Faz-se mister portanto citar o fato de que o homem vê na fé e na religiosidade um “mosaico” que lhe direcione a vida, os anseios, e não somente algo pejorativo como uma “muleta” metafísica. Para o crente, a necessidade de entrega é absoluta, e talvez daí surja as idiossincrasias pueris perpetradas pelas religiões do mundo, numa mescla frenética entre a consciência da temporalidade humana e do desejo de aqui transformar, dentro das díspares possibilidades teológicas, o mundo de Deus.
Desde o racionalismo de Descartes, marco da “voz” da subjetividade e do sujeito cognoscente, muita coisa ainda não mudou acerca de filtrarmos aquilo que deveria ser jogado fora no que diz respeito o homem e sua “irracionalidade”.
Oras, se o crente vê em Deus sua finalidade última, nada justifica nesse mundo que barbáries sejam promovidas por aqueles que professam Deus. Deus do que? Da imperfeição? Seria este Deus igualmente posto em uma escala evolutiva como os humanos e seus valores?
É notório que o tratamento que o homem dá a este assunto é ainda “mitológico”, sendo assim Deus estaria em uma escala antropormofizada de sandices “super-humanas”.
Nota-se disto portanto que para além do paradoxo existencial que separa o homem de seu criador (aqui tratamos de um existencialismo cristão, e não ateu como em Heidegger ou Sartre), a fé foi elevada à uma plataforma que justifique os atos hediondos da burrice humana.
Eu dou parabéns para aquele que de fato guarda a fé para si mesmo e não se justifica, ainda mais a fé em si mesmo, e sou ferrenhamente crítico com aqueles que dizem que é nato do ser humano a disparidade entre Deus e a si próprio.
Nada custa um pouco de fé na própria raça humana, fé em si próprio, ao fortalecer o papel existencial que devemos cumprir de acordo com nossas escolhas e determinações , de nossa responsabilidade mediante o outrem, longe de tentativas de explicar tudo através de um “marco zero” ou das causas finais teleológicas (é assim mesmo que se escreve) para tentar sempre concatenar a causalidade dos eventos e da “contingência” do ser humano.
Àqueles que podem estar pensando agora que isto estaria fadado ao caos, eu responderia que fé não é “freio” humano, e sim motivo para ofuscar a real necessidade do racionalismo que nos compete, não o racionalismo instrumental, mas daquele necessário para tocar a humanidade longe dos “fantasmas” de sua subjetividade ainda adormecida nos contos de fada, daquilo que nos impede de possuirmos, através dos grilhões da punição (sempre implícita no mais belo dos diálogos), que não permitem o florescimento do potencial humano, pois fomos obrigado a acreditar que o homem é defeituoso por excelência.
Defeituoso é este juízo, pois sempre, em se tratando de fé e uso de religião, seremos como aquele eu só “bebe socialmente”.
O existencialismo ensina que a autenticidade do homem jaz na consciência de seu estado temporal, de sua finitude, de suas responsabilidades mediante o outro e da necessidade de um mundo melhor.
Tecnicamente, sob um postulado cético agora de que somos nossos co-autores, é bem vinda a hipótese sartriana da existência precede a essência, e não o contrario, pois isto nos remete à amarga constatação de que o real é aqui e agora, e de que é neste orbe que nossas ações e vontades terão algum valor, bem mais do que digladiar a sangue e verborragias acerca de quem possui as chaves da “cidade de Deus”.
O relativismo extremo também situado na esfera metafísica (das religiões, e não da filosofia), é de grande contribuição para calçar como base nosso relativismo temporal humano, com bela dose de senso comum e de crenças estabelecidas, sempre dissonantes em relação à apreensão de uma ética humana, que não seja aquela somente do imediatismo hedonista/niilista que se conforta a qualquer momento nos braços de uma estatua de um deus que se esconde no fundo do túnel de nossa subjetividade, acessado somente nos momentos de desespero, visão esta muito mecanicista de fé.
Surge disto outra discrepância em que o homem está sujeito, por sua natureza aprioristicamente dita como defeituosa e pouco evoluída, à eterna dança entre o sagrado e o profano. O que afinal de contas seria sagrado e o que de fato seria profano, dentro das limitações e absolutismos teológicos, mesclado com opiniões diversificadas daqueles que em nome de deus professam? Quando não muito, os líderes religiosos usam de seu próprio universo subjetivo para tocar sua manada, e disto tentam transformar em verdades universais para uma platéia de cinco ou seis integrantes. O que dizer então da estupidez de um contingente enorme que segue um ou outro “aloprado” que se calça, de novo, nos “ideais” platônicos como que da verdade, do Bem, Deus, e justa sociedade, jazem em conceitos eternos e excludentes das necessidades pragmáticas da existência.
Isto tudo mostra apenas uma coisa, ou ao menos indica algo: A inautenticidade humana, o sentimento de absurdo mediante o vácuo existencial. Mas será que então fé e religião estão aí para nos consolar?
O sábio Kierkegaard talvez soubesse desta resposta em sua filosofia “in loco”, ou seja, mesmo sendo um cristão, neste caso, a fé seria um “salto” realizado pelo homem rumo ao incognoscível, mas isto não o livraria de ser assolado pelo sentimento de absurdo, ou desespero humano, que sua instância temporal o proporcionava. Posto isto, verificamos que mesmo para os crentes em Deus, há um elemento que paira no ar, a partir da atitude filosófica, de que a intangibilidade divina é um fantasma a assombrar aqueles que refletem acerca da existência enquanto causas primeiras e causas finais.
Para o existencialismo ateu, isto se procede da mesma forma, mas diria que de certa forma mais atenuante, pois não há o elemento divino mais aqui, sendo que a existência sartriana precede a essência, ou seja, o conflito em que Sartre chamava de “Náusea”, que Camus chamou de “Absurdo”, e que Kierkegaard chamou de “Desepero” , se dá em Sartre pela necessidade constante de imprimir em nós mesmos atributos que nos impelem à realizações que justifiquem nossa existência, uma vez que de nada viemos e de nada sabemos acerca de nós mesmos, e que todos somos iguais nesta condição existencial, que para tal não há relativismos que nos separem desta crucial condição humana, grosso modo.
O pensamento é um exercício prazeroso, ainda mais quando este visa ressignificar conceitos outrora tidos como absolutos. E ainda em se tratando da própria fé, nos leva a indagar onde estão contidas nossas crenças dentro de um mosaico multicor das teologias e mitos em que se debruçam os homens. Novamente outro paradoxo se forma: como haver absolutismo dentro do próprio relativismo? Isto só pode ocorrer na mente do homem, que é limitada para a compreensão daquilo que foge ao racional.
Mas que verdade então nos valida? A minha, a sua, ao do outro? Penso que nenhuma, a não ser aquela que seja uníssona e de conformidade para o bem viver em sociedade, segundo os estatutos que regem cada cultura, sob a luz do entendimento e do progresso humano em todas suas diferentes instâncias, mas não daquelas que nos remetem às convenções sociais, pois aí novamente jaz o fantasma do relativismo, este que por sua vez ainda nos afasta de um consenso para aquilo que é igualmente desejado por todos, como questões básicas de subsistência e bom convívio.
Por certo isto só procede à luz da razão, para terror de quem imagina que este mundo é secundário, deixando questões impreteríveis para segundo plano.
Aqui o problema maior reside no fato de abandonarmos nossas aspirações, no agora, para enveredarmos em uma dissonância que compõe a incerteza ou agnosticismo perante o incognoscível.
Oras, aqui não custa nada evidenciarmos fatos meramente hipotéticos ou não, como o fato de nossa desesperança mediante o credo e nossa condição humana.
Como já foi dito, a ausência de probabilidade não significa a probabilidade da ausência, no entanto, dentro deste escopo cria-se uma lacuna imensa para interpretações mil, e uma delas, e a pior, é a necessidade que o homem se impõe a si mesmo de um dogmatismo absoluto que lhe caia como uma luva frente à desesperança e a angústia existencial.
Com o que de fato nos importamos e damos valor em nossas vidas? Dentro de um mundo com um niilismo evidente (não compreende isto quem está imerso nele), nossas mais pueris desaventuras de adolescentes “octogenários” e com uma razão deficiente, faz jus à toda forma de “lembretes” possíveis a nos desviar da verdadeira condição humana, ou seja, como a própria filosofia professa, a capacidade de reflexão humana é primordialmente racional, mas cada vez mais este racionalismo segue rumo ao instrumental humano meramente.
Por que há tantos indivíduos que criticam o homem dentro de sua racionalidade? A resposta é simples: racionalidade é compreendida hoje como um modelo que lança o homem em uma eterna dicotomia mente/emoções.
Por certo o fato de nossas emoções exercerem um papel importante em nós é super válido, mas então por que será que o homem tem a capacidade de raciocinar? Seriam estas emoções de fato “instancias” ontológicas, ou seja, parte integrante de nosso ser? Ou seriam elas apenas intencionalidade, pavor, angústia e liberdade? Mesmo diante de nossa capacidade de raciocínio? Faz-se necessário também lembrar que toda sorte de ciência, iluminismo, humanidades, e tantos outros prodígios humanos constituíram-se após o advento da razão.
Pois bem, é certo que houve uma era em que o homem era acreditado apenas a introjetar em si o positivismo, que seria a plena capacidade humana de construir cada vez mais para a sociedade prodígios em todas as instâncias humanas, através da razão somente. Eu particularmente não desacredito nisto, pois como mostra o próprio existencialismo, se somos responsáveis não somente por nós mesmos mas também pelos outros enquanto “projetar-se” e fazer escolhas que abarquem toda a humanidade, a razão tão somente ainda é o exercício para tal, pois a teologia até então somente nos mostrou o contrário.
Mas após o positivismo, que já estava se esquecendo do homem novamente enquanto sujeito do conhecimento e sujeito possuidor de individualidade, a filosofia começa novamente a resgatar algo muito parecido com o primado da subjetividade empreendido por Descartes. Novamente tenta-se colocar o homem como necessidade central, para além daquelas que tão somente se preocupavam com as coisas e seus significados subjacentes. Tentou-se novamente então lidar com as coisas em si mesmas, sem teorizações, isto é, das necessidades reais do homem e também suas reais circunstâncias.
É interessante notar aqui também que a filosofia de Marx rompeu definitivamente com a teologia e com Deus, pois o homem estava sendo esquecido também em sua instância social. Outra evidencia de que a fé estaria esquivando o homem de sua real condição.
Devo salientar também que aqui o discurso não é da existência ou não de Deus, e por certo Deus (não como concebem os tresloucados por aí), em sua ininteligibilidade, algo que correspondesse à própria dimensão do universo e tantos outros debates metafísicos (filosóficos, é claro), não estaria, logicamente aqui, de igual forma relacionado à concepção apriorística do homem em toda sua limitação intelectual.
Oras, este é, como já havia dito aqui, o primeiro dos absurdos!
Como é possível, e de certa forma “surreal”, observarmos alguém bradar em esquinas, ou mesmo em igrejas, e atém em programas televisivos, qual a vontade de Deus a ser realizada neste mundo e mediante a condição humana???
qual o tamanho desta sandice e qual a tênue linha que separam estes indivíduos da loucura? Ou melhor, da soberba e pretensão?
O absurdo então se concretiza, por parte dos tresloucados, em reduzir uma gama de ininteligibilidade (Deus), um dos maiores problemas da filosofia no que concerne o “conhecimento”, a uma instância humana com todos os atributos humanos também, muito pardecido com a antropomorfização dos deuses de outras mitologias. Pasmem!
Voltando ao quesito de Angústia, não é a fé apenas, e nem Deus apenas, que livrará o homem de sua condição, da contínua necessidade de de realizar-se e da constante constatação de si mesmo, e de tantos outros em sua mesma condição. Por certo mesmo com a afirmação da existência de Deus, e se o mesmo fosse reduzido a uma escala humana, este estaria muito decepcionado como o homem em si se relaciona com ele mesmo, e com Ele.
Mas isto aqui não vem ao caso, pois o ponto central é da relação do homem com sua “má-fé” (inautenticidade) e de sua temporalidade, do divino “inalcançável”, da tensão dialética que se instala através da história e de sua condição humana, da aparente sensação de que Deus o abandonou, dos pedidos clementes da humanidade mediante o Deus que se cala. Somente a fé pode superar isto.
O salto de fé que o homem faz é, portanto, um estado genuinamente inserido nas necessidades de sua condição e contingência. Não poderia ser diferente dado sua natureza. Também seria igualmente impossível, no final das contas, exigir que muito disto fosse diferente, dentro do escopo existencial.
O problema então surge de como o homem, agora, lida com esses fatos. De um lado temos os céticos, de outro os ateus, e por fim os fanáticos que são inclusive capazes de atrocidades em nome de Deus. Verdadeiras “tribos” que se indispõem entre si.
Os céticos por certo dirão que o verdadeiro conhecimento de algo é impossível. Os ateus dirão que estão livres para todo o sempre, descompromissados com uma leitura mais “moralista”, que com certeza não significa que exista ateus que tenham um valor ético muito visível. E por fim os fanáticos religiosos irão em algum momento lançar o olhar reprovador do princípio do terceiro excluído, validando apenas a possibilidade de suas conjecturas ou não.
Mediante isto tudo podemos afirmar que a atitude filosófica visa abarcar a todos, pois o exercício do pensamento, em uma dialética ascendente, é muito prazeroso e clarificador, destruindo as “trevas” que ainda nos prendem às verdades incontestáveis de nossa concepção de mundo, do sendo comum. Pois afinal de contas, se há tantas religiões no mundo, o que de fato pode validar a hipótese desta ou daquela religião estar certa e a outra errada? E se há tantos deuses diferentes, pois assim elas dizem que os seus deuses são únicos, como ficaria a proposição de Deus enquanto ente indivisível? Ah, ele pode se mostrar de varias maneiras? Sim, compreendo! Pois até já me disseram que ele também é a bipolaridade e a dualidade do ser. O piot é ouvir “se Deus quiser”, ou “Deus quis que assim fosse”, mesmo mediante o quadro mais cruel de todos....hum, isto me soa outra justificação casualística, e este assunto ressuscitaria Heráclito ou até mesmo Aristóteles dentro de suas magnificas explanações para o início de tudo.
E por falar em subjetividade, não vale aquela sem nenhum critério que seja.
O inferno são os outros”, frase atribuída por Sartre ao exemplificar que dentro de nossos projetos e escolhas, devemos lidar com as atribulações alheias e sempre a isto transcender.